Publicações em redes sociais afirmam que projeto usaria insetos com material genético alterado.
Em grupos virtuais, algumas publicações chamam atenção para um projeto aprovado pela Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos. No caso, o plano envolve soltar, no meio-ambiente, mosquitos geneticamente modificados, nos estados da Flórida e da California.
Nas redes sociais, esse projeto está sendo associado a uma fala antiga do bilionário Bill Gates, fundador da empresa de tecnologia Microsoft.
São diferentes postagens, porém todas com legendas semelhantes. Uma das mensagens alega que “GATES QUER LIBERAR MOSQUITOS GENETICAMENTE MODIFICADOS QUE LEVAM A VACINA. (SERINGAS VOADORAS)”.
A base para a acusação é uma participação de Gates no programa TED Talk – que ocorreu em 2009 – no qual ele faz uma palestra sobre o uso de mosquitos geneticamente modificados. Juntas, as publicações já somam cerca de três mil visualizações.
Trata-se de um projeto real, aprovado pela EPA, mas que nada tem a ver com as ditas “vacinas voadoras”. Ainda no começo de março, a agência aprovou a liberação de mais de dois bilhões de mosquitos machos com material genético alterado na Flórida e na Califórnia, após um programa piloto no ano passado em Florida Keys, que é um conjunto de ilhas no Sul do estado.
A Oxitec, empresa de biotecnologia que desenvolveu os mosquitos, diz que o objetivo do projeto é reduzir a transmissão de doenças nocivas, como dengue, Zika, febre amarela e chikungunya.
No caso, os mosquitos Aedes aegypti machs são geneticamente modificados para que transmitam para sua descendência genes que fazer com que estes insetos não vivam por muito tempo. Os machos com esse gene modificado são soltos na natureza, para que acasalem com fêmeas selvagens.
Os mosquitos nascidos a partir desse contato viverão por pouco tempo, não vão atingir a maturidade e, assim, não terão oportunidade de contaminar os seres humanos que vivem na região.
E porque são alterados os genes só de mosquitos machos? Porque eles não picam os seres humanos. Só as fêmeas fazem isso. Assim, não há possibilidade de um mosquito alterado geneticamente transmitir nenhuma alteração genética para uma pessoa.
Parte do objetivo com a nova aprovação da EPA é estudar os mosquitos geneticamente alterados em dois ambientes diferentes, disse Meredith Fensom, chefe de assuntos públicos globais da Oxitec. E, por isso, foram escolhidos dois estados litorâneos, mas com clima bem diferente um do outro.
Na Flórida, os mosquitos Aedes aegypti são bem conhecidos, afirma a especialista, e o estado tem enfrentado surtos de dengue desde 2020. Na Califórnia, a espécie está crescendo, mas não há casos confirmados de doenças espalhadas pelo inseto, de acordo com as autoridades estaduais de saúde.
Sobre Bill Gates, ele realmente é um defensor da iniciativa. Por isso, fez a palestra citada em algumas mensagens, em 2009. Gates é um notório defensor de políticas de enfrentamento de doenças que atingem prioritaramente os países mais pobres, como a malária, também transmitida por mosquitos(só que de outra espécie).
Na palestra citada, Gates chega a fazer uma piada e soltar alguns mosquitos no auditório. A ideia do bilionário era descontrair a plateia, dizendo que ali estão pessoas com poucas chances de contrair malária, por viverem em um país desenvolvido. Mas ele logo informa que os mosquitos que soltou não estão infectados.
Não há informação de que algum participante da plateia tenha se queixado da brincadeira. O que não seria de se estranhar, caso alguém discordasse do método do empresário, já que cada participante da plateia pagou pelo menos oito mil dólares para assistir a palestra. As informações são do próprio site da TED Talk.
É surpreendente que esse projeto seja tão desconhecido por aqui. O Brasil foi um dos primeiros países em que a iniciativa foi testada. Até pelos altos números de casos das doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, há muitos anos.
A Oxitec, em 2016, produziu mosquitos geneticamente modificados para o Brasil. A ação aconteceu em Piracicaba, município paulista. Os insetos conseguiram reduzir em 82% a quantidade de larvas do mosquito Aedes aegypti espalhadas por um bairro da cidade.
Piracicaba vivia um de seus maiores surtos de dengue, mas no bairro de Cecap/Eldorado, em 2015, foram registrados apenas nove casos da doença, após o uso do mosquito modificado. Antes da ação, foram 124 notificações.
Durante o período de uso da tecnologia na cidade, 25 milhões de mosquitos machos estéreis foram liberados no bairro alvo do programa. O mosquito produzido pela empresa, com o nome comercial de “Aedes do bem”, possuia a mesma alteração genética que aqueles que serão usados na Flórida.
Portanto, é falso que a Flórida aprovou imunizantes que seriam “distribuídos” através de mosquitos geneticamente modificados. O projeto da Flórida é real e vai realmente liberar mosquitos genéticamente modificados no ambiente, porém nada tem a ver com vacinas. A ideia é combater a disseminação de doenças, como a dengue e febre amarela.
Em relação ao Bill Gates, o nome do bilionário foi associado às notícias por conta de uma conferência de anos atrás, na qual Gates fala sobre doenças transmitidas por mosquitos. Porém, novamente, o discurso do fundador da Microsoft não tem nenhuma relação com o projeto em curso nos Estados Unidos.
É fake que Flórida aprova vacinas através de mosquitos geneticamente modificados
REPRODUÇÃO/ARTE R7